Reinaldo Azevedo.
Colunista do UOL 09/05/2020
Já está com o ministro Celso de Mello o HD com a reunião que o
presidente Jair Bolsonaro fez no dia 22 de abril com seus ministros,
presidentes dos bancos públicos e outros auxiliares diretos. O pedido foi feito
pela Procuradoria Geral da República e autorizado pelo ministro Celso de Mello,
relator do caso no Supremo.
Segundo Sergio Moro, naquela oportunidade, Bolsonaro teria se
referido às mudanças na Polícia Federal, deixando claro que trocaria o ministro
se necessário. O próprio presidente afirmou que entregaria a fita de bom grado
para evidenciar que não cometera crime nenhum. Depois, recuou. Mas atenção!
Esse recuo não se deve ao fato de temer que sua investida contra Moro seja
considerada crime. O busílis é outro.
Thais Oyama informa em sua página neste portal que Abraham
Weintraub, por exemplo, teria chamado os 11 ministros do Supremo de
"filhos da puta" num ambiente com outras críticas ao Congresso. No
Twitter, ele não chegou a negar que tenha acontecido. Disse ser um homem
educado. Evidenciou mais de uma vez ser essa uma afirmação falsa.
De todo modo, é sabido que palavrões ecoaram pela sala porque
Jair Bolsonaro não chega a ser, assim, um Luís de Camões quando está bravo. E
ele estava. Muito!. Pode não ter a sintaxe sofisticada de um Bocage, mas
conhece parte do vocabulário ao menos.
Bolsonaro e outros teriam feito críticas à China. O STF, não
custa lembrar, abriu inquérito contra Weintraub por racismo. A pedido da PGR. E
racismo contra os... chineses. Vamos ver. Uma das alegações da AGU para pedir
que apenas parte do material fosse enviada ao Supremo falava em "questões
sensíveis" na área de relações internacionais. Dado o contexto, parece
razoável supor que, mais uma vez, o gigante asiático tenha sido alvo de
ataques. Na miúda, Bolsonaro comprou a tese que Trump adora jogar no ventilador
de que o coronavírus pode ser parte de uma armação chinesa para dominar o
mundo. No momento, é a teoria conspiratória mais influente na extrema-direita
mundo afora. Não seria diferente entre bolsonaristas.
Xingamentos ao STF,
ofensas à China... Nada disso é muito bom. Mas o maior temor é outro. Numa
coisa coincidem todas as versões, incluindo a de Moro, sobre o conteúdo da
fita: Bolsonaro ameaçou todos os ministros que não fizessem as nomeações de
acordo com os interesses que ele passou a patrocinar no Congresso. Moro foi
apenas um dos ameaçados. E, como se verá, não se vai chegar a crime nenhum.
O que Bolsonaro e o núcleo duro do Planalto mais temem é a
evidência de que o presidente bateu o porrete na mesa e deu ordens para atender
aos interesses do Centrão. Não disse com essas palavras. Mas é esse o sentido.
Sempre se podem pedir desculpas à China e ao Supremo... O
problema é a guinada de Bolsonaro rumo ao Centrão para tentar se livrar de um
processo de impeachment. Suas milícias digitais sobreviveram quase intactas à
saída de Luiz Henrique Mandetta e passaram a xingar Mandetta. Suas milícias
digitais sobreviveram quase intactas à saída de Moro e passaram a xingar Moro. A
questão é saber se resistem à evidência de loteamento do governo com os
valentes do Centrão, também alvos de xingamento no ato golpista de domingo
passado.
Em seu despacho, escreveu Celso de Mello ao pedir uma
manifestação da Procuradoria Geral da República:
"Esse
sigilo, que tem caráter pontual e temporário - autorizado pela cláusula
inscrita no art. 5º, inciso LX, da Constituição da República, cuja
possibilidade de aplicação expressamente ressalvei na decisão proferida no dia
05/05/2020 -, será por mim levantado, em momento oportuno”.
A reunião, para quem souber lê-la, é só o marco histórico da
rendição de Bolsonaro ao Centrão. Bolsonaro tem receio do efeito junto a seus
patriotas. Esses bambas podem aderir até à justificação do homicídio em massa e
fazer pouco caso dos que sofrem. Mas corruptos do Centrão? Ah, isso nem pensar!
E, no entanto, terão, parafraseando Regina Duarte, de levar
cemitérios nas costas. Mais o Centrão.
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