As perigosas parcerias da Google com governos nacionais
Por Alan Macleod para
MintPress News em 8 de abril de 2020.
Traduzido para o
português por Leonardo Godim em 10 de abril de 2020.
Em meio ao combate ao
COVID-19 (coronavírus), a Google anunciou sua parceria com dezenas de governos
ao redor do mundo, compartilhando o histórico de localização de seus usuários,
e, no processo, nos dando uma compreensão sobre o quanto a companhia do Vale do
Silício sabe sobre nós.
“Na medida em que
comunidades globais respondem ao COVID-19, ouvimos de oficiais de saúde pública
que o mesmo tipo de informação agregada e anônima que usamos em produtos como o
Google Maps poderia ajudar na tomada de decisões críticas para combater o
COVID-19”, escreveu, apresentando sua montanha de dados coletados de forma
intrusiva como positiva. “Nós esperamos que estes relatórios irão ajudar a
balizar decisões sobre como controlar a pandemia de COVID-19”, adicionou,
sugerindo que os dados de localização de dispositivos dos usuários podem
“ajudar oficiais a entender mudanças em deslocamentos essenciais”, informar
empresários e ajudar governantes locais a planejar e providenciar formas mais
eficientes de serviço de transporte, desta forma limitando a disseminação deste
vírus mortal.
Os dados liberados,
mesmo para o público, são certamente interessantes (e um tanto preocupantes).
Por exemplo, dados de localização colhidos de smartphones mostram que agora
ocorrem 85% menos deslocamentos a mercearias e farmácias na Itália, se
comparado ao início de fevereiro, antes de o coronavírus atingir o país. A
Itália entrou em um bloqueio extensivo, os dados da Google mostram isso.
Varejos e visitas recreativas baixaram 94%, deslocamentos a parques baixaram
90% e estações de trânsito, 87%.
A curva de infecção do país parece finalmente achatar. Em contraste, varejos e visitas recreativas nos Estados Unidos baixaram apenas 47%, visitas a mercearias e farmácias baixaram 22%, parques, 19% e estações de trânsito, 51%, sugerindo que a população dos Estados Unidos não está ficando em casa o suficiente para amortecer o impacto do vírus.
A Google insiste que
sua nova política não irá violar a privacidade dos usuários, prometendo “aderir
aos nossos rigorosos protocolos de privacidade e proteger a privacidade das
pessoas. Nenhuma informação de identificação pessoal”, afirma, “será
disponibilizada a qualquer momento.” Isto não tem tranquilizado a todos. A
MintPress News conversou com um executivo de publicidade que virou os olhos
durante o pronunciamento.A curva de infecção do país parece finalmente achatar. Em contraste, varejos e visitas recreativas nos Estados Unidos baixaram apenas 47%, visitas a mercearias e farmácias baixaram 22%, parques, 19% e estações de trânsito, 51%, sugerindo que a população dos Estados Unidos não está ficando em casa o suficiente para amortecer o impacto do vírus.
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“Seu nome é apenas um
ponto de informação”, disseram, notando que “as camadas e camadas de informação
que você está fornecendo,” como onde você vive, quais são seus interesses e de
quais contas em redes sociais você sempre frequenta (sua própria), torna mais
do que fácil identificar de quem são os dados que você está olhando. “É você,
você gostando disso ou não, mesmo que seu nome não esteja anexado”, disseram.
O grupo de liberdades
civis sem fins lucrativos, o Electronic Frontier Foundation, também expressou
algumas preocupações com a notícia. Ainda que eles reconheçam que os dados
armazenados pela Google podem ajudar a combater o COVID-19, eles alertaram que
o consentimento deveria ser requerido antes das informações serem usadas e o
processamento deveria ser transparente. “Especialistas irão constantemente
estar trabalhando dentro de companhias privadas com acesso privado a
informações. Mesmo que todos eles façam as decisões corretas, o público precisa
poder rever estas decisões porque estas companhias estão compartilhando dados
públicos”, afirmaram, intimando a Google a divulgar sua metodologia completa.
O delator
(whistleblower) e defensor da privacidade da informação Edward Snowden foi
além, afirmando em uma entrevista no mês passado que “não há qualquer evidência
sólida que isso funcione”. “Não é o GPS de seu telefone” que eles estão usando,
ele disse, afirmando que, enquanto não estiver no modo avião, alguns dados
podem ser capturados independentemente do seu consentimento. O site de tecnologia
The Verge, todavia, escreveu que os dados são colhidos apenas de usuários que
já optaram por armazenar seu histórico de localização. Além disso, se os
usuários desabilitarem seu histórico de localização, isso deve preveni-los de
maior parte do rastreamento.
A tecnologia permite
o monitoramento de indivíduos para melhor regular as ordens de isolamento.
Porém, isso abre novas possibilidades para regimes autoritários. Israelenses
que violarem a quarentena estão agora sujeitos a até sete anos na prisão, e os dados
de localização poderiam ser usados contra indivíduos. Seria algo e tanto ser
enviado à cadeia por seu telefone notar que você saiu para caminhar. Além
disso, dado o histórico de aplicação leis racistas no país, a lei tem potencial
para sérios abusos.
O movimento da Google
não é nem de longe o último em uma longa linha conectando grandes empresas de
tecnologia com o governo e a segurança de Estado. Em seu livro intitulado “The
New Digital Age: Reshaping the Future of People, Nations and Business” (A Nova
Era Digital: Remodelando o Futuro das Pessoas, Nações e Negócios), Eric Schmidt
e seu amigo Jared Cohen, executivo da Google, escrevem, “O que Lockheed Martin
foi para o século vinte…companhias de tecnologia e segurança cibernética [como
a Google] serão para o século vinte um.”
Em 2018, o Facebook
anunciou sua parceria com o Atlantic Council (Conselho do Atlântico) para
ajuda-los a limpar suas plataformas de fake news. Uma ramificação da OTAN, o
Conselho é gerido por dezenas de antigos oficias do governo, incluindo Henry
Kissinger, Colin Powell e Condoleezza Rice, e inúmeros antigos líderes da CIA,
incluindo Michael Hayden, Leon Panetta e Michael Morell. Desde que começou a
trabalhar com o Conselho, o Facebook tem se movimentado rapidamente para
suprimir informações e posicionamentos vindos de inimigos de Washington,
incluindo os governos da Rússia e da Venezuela.
E quando Trump assassinou o general iraniano Qassem Soleimani, o Facebook baniu todas mensagens de suporte ao estadista morto, a despeito do fato de que ele era popular entre mais de 80% de seus conterrâneos. Facebook explicou sua decisão, apontando que eles não são um provedor de serviço neutro, mas uma empresa estadunidense que opera sobre as leis dos Estados Unidos e que quando Trump declara qualquer pessoa um terrorista, eles irão cooperar.
E quando Trump assassinou o general iraniano Qassem Soleimani, o Facebook baniu todas mensagens de suporte ao estadista morto, a despeito do fato de que ele era popular entre mais de 80% de seus conterrâneos. Facebook explicou sua decisão, apontando que eles não são um provedor de serviço neutro, mas uma empresa estadunidense que opera sobre as leis dos Estados Unidos e que quando Trump declara qualquer pessoa um terrorista, eles irão cooperar.
Ainda que o último
uso de nossos dados pela Google é, pode-se dizer, a única ocorrência de seu uso
para ajudar a humanidade ao invés de incessantemente nos bombardear
publicidade, ele ainda possui preocupantes ramificações. Snowden alertou que
novas leis infringindo as liberdades civis tendem a ser “pegajosas”, isto é,
serem muito difíceis de se livrar. Financiando ambos partidos políticos e sendo
pagos bilhões pelo governo e pela segurança de estado por contratos militares,
é crescentemente difícil ver onde grandes companhias de tecnologia como a
Google acabam e o governo começa. Talvez a profecia de Schmidt e Cohen estivava
correta.
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Alan MacLeod é o
escritor chefe da MintPress News. Após completar seu PhD em 2017, ele publicou
dois livros: “Bad News From Venezuela: Twenty Years of Fake News and
Misreporting” (Más Notícias da Venezuela: Vinte Anos de Fake News e Falsas
Informações) e “Propaganda in the Information Age: Still Manufacturing Consent
(Propaganda na Era da Informação: Ainda Manufaturando Consenso). Também
contribui para o Fairness Accuracy in Reporting, The Guardian, Salon, The
Grayzone, Jacobin Magazine, Common Dreams, The American Herald Tribune e The
Canary.
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