EL PAÍS - Afonso Benites
© ADRIANO MACHADO
(REUTERS) Flávio e
Carlos Bolsonaro, filhos do presidente na diplomação dele em 2018.
Um dia após a queda
do ex-juiz Sergio Moro do
Ministério da Justiça, ganhou força em Brasília a tese de que o presidente
Jair Bolsonaro estava agindo para
proteger ao menos dois de seus filhos, o vereador Carlos e o
senador Flávio, de investigações tocadas pela Polícia Federal. O objetivo do
presidente seria exonerar o então diretor Maurício
Valeixo para interferir em apurações que estão em andamento,
principalmente no Supremo Tribunal Federal e no Ministério Público do Estado do
Rio de Janeiro. A Corte investiga Carlos Bolsonaro por
disseminação de fake news. Enquanto o MPF apura o suposto esquema de
apropriação de salário de assessores, a rachadinha, que existia no
gabinete do senador Flávio Bolsonaro, quando ele era deputado estadual. Os dois
irmãos se filiaram recentemente ao Republicanos, legenda umbilicalmente ligada
à Igreja Universal.
O vereador Carlos é
apontado no inquérito que investiga a disseminação de fake news como um dos
líderes de um grupo que espalha massivamente notícias falsas e boatos pela
internet e pelo aplicativo WhatsApp contra
opositores do presidente e contra instituições, como o STF e o Congresso
Nacional.
Desde a época em
que Bolsonaro era deputado, Carlos é o seu estrategista nas redes sociais. Foi
ele quem indicou os assessores presidenciais para atuar nesta área e seria o
mentor o que ficou batizado em Brasília de “gabinete do ódio”, formado por
profissionais responsáveis por defender Bolsonaro nas redes e atacar os
adversários. Trata-se de uma usina de notícias falsas com táticas
diversionistas que beneficiam Bolsonaro, com apoio inclusive de robôs. Uma pesquisa do início deste mês
revelou que até 55% das publicações favoráveis ao presidente no
dia 15 de março foram feitas por robôs.
O novo
diretor-geral da Polícia Federal, em substituição a Valeixo, que era indicação
de Moro, será o delegado Alexandre Ramagem,
que hoje é diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Ramagem
é amigo de Carlos. Recentemente, o presidente disse a parlamentares que tinha
sob o seu poder relatórios da Abin que apontavam que o presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), estariam
articulando o seu impeachment. O documento fora encaminhado por Ramagem.
Bolsonaro também admitiu que sempre cobrou informações da Abin para seu
conhecimento.
O inquérito que
investiga o vereador é tocado pelo STF, relatado pelo ministro Alexandre de Moraes, que conta com o
suporte de um grupo de quatro delegados da PF. É sigiloso. Seus detalhes foram
revelados pelos jornais Correio Braziliense, na quinta-feira, e
pela Folha de S. Paulo, neste sábado. Além dele, há um segundo
inquérito que pode envolver o vereador, o que trata dos protestos pró-golpe
militar dos quais deputados bolsonaristas e o próprio presidente participaram
no dia 19 de abril. Há suspeita de que haja um cruzamento de dados que liguem
empresários que financiaram esses atos com a rede de fake news de
bolsonaristas.
Na sexta-feira,
quando Moro delatou a intenção de Bolsonaro de interferir politicamente na PF,
ele deixou claro o intuito do presidente de atuar em apurações no Supremo.
Pouco tempo depois dessa revelação, o ministro Moraes decidiu que,
independentemente de quem fosse o novo diretor-geral, os delegados que o
auxiliam no inquérito das fake news deveriam permanecer em suas funções. É uma
tentativa de se blindar da influência presidencial.
Rachadinha e milícias
Em outra frente, o
Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, auxiliado pela PF, avançou na apuração contra o
senador Flávio. Reportagem publicada pelo The Intercept
Brasil mostra que Flávio teria financiado com parte do
dinheiro público confiscado de salários de funcionários do seu
gabinete a construção de prédios da milícia no Rio de Janeiro e lucrou com esquema
ilegal.
O portal publicou
neste sábado documentos que mostram que os empreendimentos de três construtoras
da cidade de Rio das Pedras foram feitos com dinheiro de “rachadinha”, coletado
no antigo gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio. O MP-RJ chegou a
essa conclusão depois de cruzar informações bancárias de 86 pessoas suspeitas
de envolvimento no esquema ilegal. Além de substituir Valeixo da
diretoria-geral, Bolsonaro tinha o intuito de trocar os superintendentes do Rio
de Janeiro, responsável pelas apurações envolvendo Flávio, e de Pernambuco.
No pronunciamento que fez na
sexta-feira, o presidente Bolsonaro disse que jamais pediu para proteger os
seus familiares. “Nunca pedi para blindar ninguém da minha família. Jamais
faria isso”. Porém, admitiu que esperava ter algum interlocutor para conhecer
investigações em curso.
EM TEMPO: Caso o aperto continue vão surgir mais investidas indevidas da "família dos milicianos".
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