Yahoo Brasil.
Texto / Pedro
Borges I Edição / Simone Freire
As manifestações
chamadas de “panelaços”, no dia 18 de março, quarta-feira, em bairros centrais
de grandes metrópoles, indicaram a existência de um novo contexto político no
país, de maior afastamento entre parte da classe média e o governo Bolsonaro.
Bairros como
Copacabana e Leblon, na zona sul do Rio de Janeiro; Perdizes e Pompeia, zona
oeste de São Paulo; marcados pelos “panelaços” pró-Bolsonaro e contra Dilma
Rousseff entre os anos de 2015 e 2018, conviveram com manifestações contrárias
ao representante do poder Executivo a nível federal.
“As
manifestações apontam que o bolsonarismo deve enfraquecer consideravelmente. É
preciso considerar que Bolsonaro não tem competência política ou articulação
para uma reviravolta. O atual presidente sempre foi um integrante do baixo
escalão no Congresso Nacional, usado no atual contexto brasileiro pela elite
como um fantoche”, conta a socióloga e mestra em Ciências Humanas e Sociais
pela UFABC, Najara Costa.
O apoio a
Bolsonaro deve ser cada vez mais restrito, ligado a grupos como os
participantes da manifestação no dia 15 de março, quando pessoas foram às ruas
pedir o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso Nacional.
“O grupo
político que atuou no último domingo é o mesmo que apoiou Bolsonaro, mas que
perde forças a cada dia. Nesse sentido, Bolsonaro tende a ficar cada vez mais
isolado na tentativa de desqualificar instituições relevantes e que sustentam a
democracia brasileira como o congresso nacional e o Supremo Tribunal Federal”,
explica a cientista social.
Outro fator para
o afastamento da classe média é a agenda econômica. As promessas de Paulo
Guedes e Jair Bolsonaro de que os cortes em direitos trabalhistas, como a
reforma da previdência, garantiriam a retomada do crescimento da economia no
país fracassaram.
“O empresariado
começa ficar cansado dessa agenda que promete, promete e não entrega. Ele gosta
que o custo trabalhista seja bem baratinho, para que ele possa explorar
bastante o trabalhador, para que ele não tenha CLT. Só que o trabalhador
precisa ter emprego para que ele possa vender, para realizar o lucro. Se o
crescimento econômico é baixo e as expectativas futuras são baixas, ninguém
mais vai botar dinheiro nisso aqui”, afirma Marcos Henrique, economista e
mestre em economia política pela PUC e doutorando em História Econômica pela
USP. “Aquela classe média, que era mais antipetista do que pró-Bolsonaro,
começa a se desvincular um pouco dele”, completa.
A situação, que
já não era favorável, se agravou com a chegada do coronavírus e a maneira como
o governo tem proposto lidar com a situação. Bolsonaro tem relativizado o
impacto com coronavírus, ao afirmar que não é necessário uma histeria, e tem
caminhado na contramão das recomendações do Ministério da Saúde para sujeitos
que estiveram em contato com pessoas doentes, quando pegou na mão de pessoas e
tirou fotos com manifestantes no dia 15 de março. Da comitiva para os EUA em
que o presidente participou, 18 ficaram doentes. Bolsonaro testou duas vezes como
negativo para o Covid-19.
“Não é à toa
essa fuga explosiva de capital e esse câmbio desvalorizado com o temor
internacional do coronavírus. Isso é em parte a contradição interna de uma
agenda que há 5 anos promete e não entrega e em parte no lidar com a pandemia.
Com o coronavírus, Bolsonaro jogou a última pá de cal sobre si mesmo”, afirma o
economista.
Najara Costa
condena quem responsabiliza a atual crise pelo coronavírus. Para ela, trata-se
de uma dificuldade imposta pelo modelo econômico vigente no país e maior parte
do mundo. “Precisamos entender que a menor circulação de capital entre classes
populares afeta diretamente a burguesia branca, detentora dos meios de
produção. Não é uma crise causada pela pandemia, trata-se de uma crise do
capital. A percepção do momento ainda não é das melhores, especialmente para a
população pobre e negra”, diz.
Para solucionar
o problema da economia e dar uma resposta à crise, Paulo Guedes tem proposto,
por um lado, a entrega por parte do governo federal de R$ 200 para trabalhadores
informais ficarem em casa durante o período de três meses. O governo espera
liberar R$ 15 bilhões de reais ao todo.
Por outro lado,
quer permitir durante o estado de calamidade que os empresários cortem os
salários e as jornadas dos funcionários pela metade. Os vencimentos não podem
ser menores do que o mínimo previsto no país e nem pode-se reduzir o valor por
hora pago para cada funcionário. A medida provisória (MP) será encaminhada ao
Congresso Nacional.
“Vai gerar um
estrangulamento da capacidade de consumo. O que é um equívoco brutal. Se você
corta o salário do trabalhador, você tira a capacidade de demanda”, afirma
Marcelo Henrique.
O governo também
quer antecipar as férias de trabalhadores, mesmo aqueles que estão a apenas
seis meses no cargo. “Se a gente está vivendo uma recuperação extremamente
lenta, se o coronavírus vai parar a economia, podendo mergulhar a gente em um
PIB negativo. O que pode acontecer? A gente pode voltar para a recessão, mas
com as medidas do Paulo Guedes podemos ir para uma depressão, o que vai tornar
a situação ainda pior”, finaliza o economista.
Rodrigo Maia e o
conflito diplomático com a China
O
enfraquecimento do atual presidente pode abrir espaço para o fortalecimento de
outras figuras, como Rodrigo Maia (DEM-RJ) e João Dória (PSDB-SP), segundo
Najara Costa.
“O vácuo deixado
por sua incompetência pode ser preenchido pela própria direita, em torno de
figuras como Dória ou do atual presidente do congresso Nacional Rodrigo Maia. A
percepção é que um novo grupo político direitista atuará oportunamente na
tentativa de ‘moralizar’ o Brasil, trazendo certa ordem ao caos bolsonarista”.
No dia 18 de
março, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) responsabilizou em
publicação na sua conta no Twitter o coronavírus como uma criação chinesa. “A
culpa é da China e liberdade seria a solução”, disse.
Yan Wang,
embaixador da China no Brasil, rebateu e disse que prestará uma queixa oficial
ao Itamaraty sobre o posicionamento de Eduardo Bolsonaro. “A parte chinesa
repudia veementemente as suas palavras, e exige que as retire imediatamente e
peça uma desculpa ao povo chinês”
A China é o
principal parceiro econômico do país. De janeiro a outubro de 2019, o Brasil
exportou US$ 51.53 bilhões, o que deixou o país latino americano com uma
balança comercial positiva de US$ 21.45 bilhões nos dez primeiros meses do ano
passado.
“O Brasil
reprimarizou a sua economia novamente, virou uma grande fazenda, e essa fazenda
depende basicamente da China. Ai vai um deputado federal dizer para a China que
a culpa é dela e criando a tal da # que a culpa do vírus é chinês. Isso vai
dificultar as coisas ainda mais”.
Em resposta, o
presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia respondeu o embaixador para
repactuar o diálogo diplomático entre os dois países.
“Em nome da Câmara dos
Deputados, peço desculpas à China e ao embaixador @WanmingYang pelas palavras
irrefletidas do Deputado Eduardo Bolsonaro. A atitude não condiz com a
importância da parceria estratégica Brasil-China e com os ritos da diplomacia.
Em nome de meus colegas, reitero os laços de fraternidade entre nossos dois
países. Torço para que, em breve, possamos sair da atual crise ainda mais
fortes”, disse.
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