quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

Apesar das mudanças, Pacote Moro é um retrocesso, diz policial civil



REUTERS/Adriano Machado

O pacote de medidas que endurece a legislação penal contra crimes foi sancionado, em dezembro, pelo presidente Jair Bolsonaro. O texto foi proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, mas sofreu mudanças ao longo da sua tramitação com vetos do próprio presidente, do Congresso e inclusão de estudos de uma comissão de juristas coordenada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Morais.
Boa parte das mudanças também foi possível a partir de uma incidência política organizada e estruturada do movimento negro que denunciou nacional e internacionalmente pautas consideradas prejudiciais à população negra, como noticiou durante toda a discussão do projeto o Alma Preta.
No entanto, para Roberto Rodrigues, integrante do coletivo Policiais Antifascismo, grupo fundado em 2017 e, hoje, com aproximadamente 8 mil membros de todo o país que questionam o modo violento do trabalho das corporações, apesar de pontos importantes terem saído do projeto, não há o que se comemorar com a aprovação e sanção do pacote.
“Os vetos, as propostas adicionadas ao projeto original de Sergio Moro e as adequações que foram feitas a partir da comissão de trabalho de parlamentares e juristas considerando também os projetos do Alexandre de Moraes a gente tem que entender que estas concessões. Não podem ser consideradas grandes para a sociedade, pois este projeto é um retrocesso na medida em que aponta cada vez mais um direcionamento para um Estado penal e policial”, explica.
Tal pacote, para ele, neste sentido, não pode ser considerado uma política pública, pois o Estado está substituindo a Justiça e o direito por um “sentimento de vingança e castigo para com os cometimentos de crimes”. “Um governo onde a gente vê que falta políticas públicas no âmbito da educação, que falta políticas públicas sociais, culturais, que falta oportunidade de vida digna para a população, falta uma perspectiva de futuro, a gente entende que - deixando de promover estas condições para melhoramento da nossa sociedade de condições de vida da população - ela não pode se restringir apenas querer castigar ou punir quem comete crime”, critica.

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Pensar uma política pública de segurança pública, diz ele, requer envolver diversas variáveis. “Se você não atua na causa, por exemplo, com um debate sério sobre a política de drogas, sobre legalização de certas drogas e do comércio destas drogas, a gente vai ficar sempre atuando na consequência e com ações desastrosas para a nossa sociedade”, diz. Mas o debate aprofundado e realmente necessário sempre é deixado de lado, diz ele, porque há interesses que atendem a uma elite que se beneficia tanto politicamente, seja direta ou indiretamente, quanto financeiramente do ponto de vista econômico do que envolve esses crimes.
Rodrigues também aponta que a população negra ainda será a mais prejudicada quando o pacote estiver em vigor. Dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), do Ministério da Justiça, apontam que 64% da população prisional é composta por indivíduos negros. O Atlas da Violência 2019 mostra que essa parcela da população foi vítima de 75,5% dos homicídios registrados no país em 2017. 
“Então, evidentemente, o maior impacto destas medidas de enrijecimento do Direito Penal, do sistema processual penal, vai ser esta população, a nossa juventude que está a mercê tanto da violência quanto da repressão do Estado”, reitera.


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